23 de agosto de 2010

Discutindo a Educomunicação

O texto abaixo faz parte do relatório de mapeamento das formas educomunicativas socioambientais, realizado em julho em quatro cidades do Distrito Federal. São idéias para discussão.
Opine!
Abraços,
Fátima
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Para Deleuze a atual sociedade é uma sociedade de controle. Hardt explicita esta idéia, deixando claro que atualmente não há um conflito central, mas múltiplas contradições e que a característica desta sociedade é a oni-crise, ou corrupção, ou seja, o inverso da geração.

Se a máquina capitalista só funciona se esfa­celando, como bem dizem Deleuze e Guattari, a sociedade de contro­le também se esfacela e só funciona se esfacelando. Eis sua corrupção.

Portanto é fundamental compreender que a democratização da produção e gestão da informação nos meios de comunicação implica necessariamente em perceber que nas sociedades da modernidade contemporânea, os meios e canais de informação ocupam uma dimensão estratégica nas mediações de conflitos diversos e no redimensionamento de micro e macro poderes, formando redes e agrupamentos distintos. Por um lado este redimensionamento dificulta cada vez mais a identificação de conflitos centrais, capazes de catalisarem ações coletivas, por outro, são capazes de formar múltiplas coesões, muitas vezes sobrepostas, em torno das microconflitualidades da sociedade contemporânea. São estas “múltiplas coesões” o foco de interesse dos processos de emancipação social. Aqui reside a possibilidade de, mergulhados numa sociedade que se esfacela, criar algo novo, como uma emergência do próprio sistema que sobre ele se rebate e o modifica.

Nesse contexto, o campo ambiental surge como campo de disputas dentro de uma sociedade de controle que existe na e pela pulverização de sentidos e fazeres, mantendo o esfacelamento das subjetividades imersas no imediatismo e na aparência.

As disputas parecem ser várias, localizadas, pontuais. Mas um olhar mais demorado poderá apontar para uma disputa recorrente, e muitas vezes diminuída, frente aos dogmas políticos e econômicos – o sentido de “ambiental”. Responder “o que é meio ambiente” tem a potência de iluminar, senão todos, a maioria dos conflitos desse campo. Dar resposta a esta questão implica em revelar o tipo de relação subjetiva mantida com o meio ambiente – seus aportes culturais, econômicos, políticos e sociais. Por isso mesmo não é uma questão fácil de ser respondida e pela mesma razão é facilmente naturalizada em modelos aceitáveis pela sociedade contemporânea.

A Educação Ambiental não poderia ser diferente. Com forte raiz nos movimentos ambientalistas, seu(s) sentido(s) encontram-se em permanente conflito. O conflito em seu duplo – geração e destruição – porta possibilidades. Essas possibilidades devem ser vistas como acontecimentos que podem gerar algo novo. Novo ao sistema que as criou. A novidade não é em si um acontecimento raro. Pelo contrário – a novidade surge a cada instante, mas no instante seguinte já tornou-se antiga e obsoleta, pulverizada e imersa no conjunto de tantas outras novidades iguais.

O esforço e o desafio residem, portanto em fazer com que a novidade recicle-se continuamente, alimente-se de outras inovações, incorpore novos saberes e fazeres, ou seja, não se feche em definições que não podem resistir à volatilidade do tempo contemporâneo.

Os processos de educomunicação, tal como estão surgindo, portam a natureza de serem “acontecimentos”. Como tais, encontram o desafio de manterem-se vivos imersos nas redes de microconflitualidades e formarem coesões múltiplas capazes de alimentar o novo micro sistema emergente, divergente do sistema maior que o criou.

A produção midiática, formativa, informativa e informatizada está na ordem do dia. Cada vez mais, pessoas ao redor do mundo conectam-se e encontram-se. Culturas são difundidas com imensa rapidez e como num processo antropofágico, re-elaboradas por novos grupos sociais. Como processo complementar, a tradição retorna re-editada e as culturas populares ressurgem para ocupar um novo lugar no imaginário social. São processos pares – complementares e antagônicos. Este emanharado de pessoas, grupos e coletivos surpreendem. E a surpresa é alma da inovação e do acontecimento. Permanecer surpreendente, e portanto – incontrolável, é um grande desafio para todos desta sociedade, acostumados que somos a usar a razão para nos proteger, para prever, organizar, classificar, enquadrar, controlar, dominar.

A emancipação social necessita ser contextualizada dentro desses processos pares, dentro da volatilidade do tempo contemporâneo. Os processos educomunicativos podem abrir espaços novos de acolhimento e formação de grupos de afinidade, novas coesões mediatizadas pela comunicação – diálogo como encontro de sujeitos interlocutores que buscam a significação dos significados (1). Encontro e acolhimento que somente são possíveis numa resignificação das temporalidades, numa clara negação à homogeneização dos seres e num profundo ato de comprometimento com a vida. A educomunicação não deve se render ao apelo das definições acadêmicas ou dos modelos descritivos, já que se refere à fazeres e saberes anteriores à definição. Sua maior força está exatamente em se manter como acontecimento, em ser realizada por quem vive o novo como utopia real. 


(1) Freire, Paulo. Extensão ou Comunicação. Paz e Terra, 11ª. Ed. São Paulo, 2001

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